Brasília, 22 ago (Xinhua) -- Depois de uma década desde sua funda??o, assinada por um importante papel em fóruns internacionais e sua própria consolida??o institucional, o grupo BRICS pode ganhar relevancia nos próximos anos como espa?o para dinamizar a economia dos países membros que apresentam menores taxas de crescimento.
Em entrevista à Xinhua, especialistas brasileiros ressaltaram a importancia dos mecanismos construídos nos BRICS como ponto de partida para avan?ar em uma maior coopera??o econ?mica e tecnológica.
Para o embaixador Sergio Abreu e Lima Florêncio, diretor de Pesquisas de Rela??es Econ?micas e Políticas Internacionais do Instituto de Pesquisa Econ?mica Aplicada (Ipea), os BRICS devem passar de um mecanismo de proje??o internacional do Brasil e tornar-se em uma plataforma de oportunidades econ?micas.
"Entre 2004 e 2008 a economia brasileira p?de aproveitar o boom das commodities, e a política externa de (o ex-presidente) Lula soube aproveitar esse momento ocupando espa?os, no G20, o BASIC, o FOI, e o BRICS foram instrumentos que contribuiram para a proje??o e o protagonismo da política externa brasileira, sem dúvidas", disse.
Segundo Florêncio, no balan?o de sua primeira década, um retrato dos BRICS revela três características essenciais, em primeiro lugar sua relevancia no ambito geopolítico, e algumas similaridades entre seus membros, como a ampla dimens?o territorial e o peso econ?mico.
"O agrupamento teve um papel central no G20 financeiro, como instrumento de negocia??o da coordena??o macroecon?mica para superar a crise de 2008, e o crescimento dos BRICS e de outros emergentes contribuiu para superar a crise", afirmou.
Em segundo lugar, é evidente uma clara diversidade entre seus membros, em termos de assimetria econ?mica e desempenho no comércio internacional, e em terceiro, disparidades crescentes nestas duas áreas, em especial quando se compara a China com outros membros do BRICS.
Nesse sentido, atualmente o grupo BRICS contribui n?o só à política externa como também se espera que ele seja um ator fundamental na recupera??o da economia brasileira, indicou.
"Esse passado brilhante dos BRICS teve seu auge em 2014 na Cúpula de Fortaleza quando foi criado o Novo Banco de Desenvolvimento e o mecanismo de reservas. Uma história de sucesso", ressaltou.
"O presente ainda preserva muito disso, em termos da influência crescente da China, com boas taxas de crescimento, ao igual à índia, com crescimento econ?mico, tecnologia. Mas para os outros três, Rússia, áfrica do Sul e Brasil, essa história n?o é a mesma", advertiu.
No caso do Brasil, trata-se menos de proje??o, protagonismo, e muito mais a busca de uma política externa que contribua para as necessidades atuais do país.
"o Brasil tem agora prioridades muito mais urgentes, mais pragmáticas e mais econ?micas. Ent?o acredito que temos que mudar a política com os BRICS, para que sejam um instrumento de dinamiza??o das políticas de alguns de seus membros. Acredito que o país chave nesse processo é a China", apontou.
O país precisa atrair investimento estrangeiro direto da China, e canalizar esse investimento n?o só para contemplar as necessidades de materiais básicos do país asiático, como também em setores que s?o prioritários para o Brasil.
"Precisamos estimular a participa??o de capitais chineses em concess?es de portos, aeroportos, rotas, petróleo, gás, energia elétrica, e em setores em que o Brasil tem um potencial de competitividade e China pode trazer um avan?o tecnológico", assinalou.
Na agenda dos BRICS, acrescentou, há muito por fazer em matéria de coopera??o técnica em áreas como saúde, educa??o, tecnologia, inova??o, e isso é o que interessa ao Brasil no próximo período.
Para Carlos Mussi, diretor do escritório regional brasileiro da Comiss?o Econ?mica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), a institucionalidade construída pelos BRICS na primeira década cria uma base sólida para avan?ar em diversas áreas.
"o Brasil lutou muito, como também a China, para criar uma institucionalidade dos BRICS. A China foi muito disciplinada em manter a presidência, as reuni?es, dar todo seu apoio para garantir a continuidade do grupo", assinalou.
"Acredito que a vantagem dos BRICS é essa institucionalidade, que abre um espa?o de diálogo entre os países membros. O impacto imediato vai dentro do fluxo do movimento das rela??es internacionais em seu conjunto. Por participar do BRICS, Brasil tem um caminho institucional muito mais definido em suas rela??es com a China e outros países", destacou.
Em segundo lugar, é importante lembrar que alguns produtos do BRICS, como o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) e o Acordo Contingente de Reservas, devem se destacar em momentos de crise ou de auge econ?mico.
"Por exemplo, em uma fase de crescimento econ?mico, podemos esperar que o NBD cres?a mais rápido, é provável que a crise n?o o tenha permitido, está crescendo mas a um ritmo menor", disse.
"O ideal é que todos os membros tivessem dinheiro para colocar no NBD para impulsionar muitos projetos. Por mais que a China tenha tido muita boa vontade, os outros países enfrentam dificuldades. E com rela??o ao Fundo de Reservas, que poderia ser utilizado quando uma crise chega ao ponto de acender um alarme, felizmente n?o chegamos a isso", apontou.
As duas institui??es, sublinhou, mostram um grau de resultados da trajetória do BRICS na promo??o do desenvolvimento e uma resiliência maior entre os países, e cada membro está vendo como usar melhor os mecanismos criados.
"Agora, é verdade que mais recentemente, em certa forma o BRICS ficou em meio de uma série de iniciativas da China, como o Cintur?o Econ?mico da Rota da Seda, o Banco Asiático de Infraestrutura, ent?o a pergunta é qual será o lugar dos BRICS", apontou.
Para o Brasil em particular, onde a China ocupa há mais de uma década o papel de maior parceiro comercial, deu ao país uma inser??o mais favorável na economia internacional.
"O interessante da explos?o da China no comércio brasileiro, especialmente nos recursos naturais, é que alterou drasticamente a estrutura quase centenária de comercializa??o. A China quebrou os monopólios de comercializa??o globais, e deu oportunidade a um forte crescimento do agronegócio brasileiro e da mineira Vale", recordou.
Segundo Mussi, o Brasil está reestruturando sua vis?o tradicional nas negocia??es internacionais, que era apostar pelo multilateralismo, devido à debilita??o do sistema multilateral nos últimos anos.
"O que se esperava era que, como consequência desse processo, houvesse no mundo um foco maior nos acordos regionais, mas com a vertente protecionista de Trump isso também mudou. Pode ressurgir também o multilateralismo, pode surgir o bilateralismo, ou iniciativas específicas como o próprio BRICS ganhar importancia", assinalou.