Beijing, 4 jan (Xinhua) -- N?o há ventos nem chuvas lá, apenas meteoritos cadentes que ocasionalmente rompem a quietude. O panorama desolado no lado escuro da Lua --nunca visível desde a Terra-- esperou bilh?es de anos para receber o primeiro visitante terrestre.
Depois de orbitar a Lua por mais de 20 dias, a sonda Chang'e-4, lan?ada desde o Centro de Lan?amento de Satélites de Xichang, no sudoeste da China, em 8 de dezembro de 2018, viu inúmeras crateras, montanhas e vales na Lua.
Finalmente, seu destino no lado escuro, a Bacia do Pólo Sul-Aitken (SPA), a maior, mais profunda e mais antiga cratera no sistema solar, foi iluminada pelo sol em ascens?o.
Os desenvolvedores da Chang'e-4 decidiram nesta quinta-feira que era a hora de pousar o veículo neste mundo estéril.
às 10h15 de manh?, um motor de propuls?o variável foi ligado com a assistência do satélite de retransmiss?o Queqiao (Ponte de Pegas), que está na órbita de halo em torno do segundo ponto lagrangeano (L2) do sistema Terra-Lua, a cerca de 65 mil km da Lua, onde ele pode ver tanto a Terra como o lado escuro da Lua.
A velocidade relativa da Chang'e-4 contra a Lua foi rebaixada de 1,7 km por segundo para perto de zero, e a sonda foi ajustada para encarar a Lua e desceu verticalmente para a Cratera de Von Karman na Bacia SPA.
Quando chegou a uma altitude de cerca de 2 km, suas camaras capturaram as sombras das colinas e vales na superfície lunar. Seu computador identificou e avaliou obstáculos grandes como pedras e crateras, para que a sonda os evitasse.
Na altura de 100 metros, a sonda pairou para detectar obstáculos menores e medir os declives na superfície. Seu computador calculou novamente e selecionou o local mais seguro.
A 2 metros acima da superfície, o motor desligou. O pousador dourado com um veículo explorador prateado a bordo aterrissou na superfície desolada cinza com quatro pernas estendidas, levantando poeira.
A sonda completou o processo inteiro de pouso, que durou cerca de 12 minutos, sem interven??o do controle da Terra. O satélite de retransmiss?o enviou as primeiras fotos do lado escuro da Lua para um centro de controle em Beijing.
A Administra??o Nacional Aeroespacial da China anunciou mais tarde que a sonda pousou na área de aterrissagem pré-selecionada a 177,6 graus de longitude leste e 45,5 graus de latitude sul no lado escuro da Lua.
"é um importante marco para a explora??o espacial da China", disse Wu Weiren, projetista-chefe do programa de explora??o lunar chinês.
"é uma demonstra??o perfeita da inteligência humana", comentou Jia Yang, vice-projetista-chefe da sonda Chang'e-4, da Academia Chinesa de Tecnologia Espacial (CAST).
Batizado com o nome da deusa da Lua chinesa "Chang'e", o programa de explora??o lunar da China, que come?ou em 2004, inclui em orbitar e pousar na Lua e levar amostras de volta para a Terra.
Depois que a Chang'e-3 completou o primeiro pouso suave da China na Lua em 2013, os especialistas espaciais do país tra?aram objetivos mais altos, esperando que a Chang'e-4 possa executar tarefas sem precedentes e mais desafiadoras.
"Pouso no lado escuro da Lua é mais arriscado do que no lado próximo. O terreno áspero no lado escuro pode levar a muitos problemas", apontou Sun Zezhou, projetista-chefe da Chang'e-4, da CAST.
"Mas solucionar esses problemas poderia ajudar a preparar a base para a explora??o espacial futura. Um pouso de alta precis?o é uma necessidade para mais explora??es da Lua e asteroides. Esperamos atingir a Lua inteira e até o sistema solar inteiro", destacou Sun.
"O lado escuro da Lua tem características únicas jamais exploradas in-loco", ressaltou Zou Yongliao, diretor da divis?o de explora??o lunar e espa?o profundo da Academia Chinesa de Ciências (ACC). "A explora??o desta terra virgem pela Chang'e-4 pode gerar avan?os."
A Lua é travada à Terra de acordo com a maré, rotando ao mesmo ritmo que ela orbita a Terra, por isso um lado dela pode ser visto da Terra, enquanto o outro, o lado escuro, é um mistério até agora.
Cerca de 60 anos atrás, a sonda Luna 3, da Uni?o Soviética, capturou as primeiras imagens do lado escuro da Lua. E cerca de 50 anos atrás, três astronautas da miss?o Apollo 8, dos EUA, se tornaram as primeiras pessoas a vê-lo com seus próprios olhos.
Os orbitadores lunares mostraram que os dois lados da Lua s?o muito diferentes: o lado próximo é relativamente plano, enquanto o lado escuro está densamente pontilhado com crateras de impacto de tamanhos diferentes.
Os cientistas acreditam que a crosta lunar no lado escuro seja muito mais espessa que a do lado próximo. Porém, a raz?o é ainda um mistério. Apenas explora??es in-loco poderiam revelar os segredos.
A Lua e a Terra compartilham uma "infancia" semelhante. Mas os vestígios do remoto passado na Terra foram apagados pelas atividades geológicas. "A Lua poderia fornecer algumas percep??es para a história inicial da Terra", salientou Lin Yangting, um pesquisador do Instituto de Geologia e Geofísica.
Explorar a Cratera de Von Karman na Bacia SPA é importante em outro sentido. A cratera recebeu o nome de um matemático, engenheiro aeroespacial e físico húngaro-americano no século 20, que também foi professor de Qian Xuesen e Guo Yonghuai, fundadores da indústria espacial da China.
Quase 50 anos se passaram desde que o ser humano pisou pela primeira vez na Lua. Será que voltaremos a visitá-la? Como a radia??o na Lua afetará os astronautas?
Cientistas da China, Alemanha e Suécia querem encontrar as respostas com a Chang'e-4, e fazer prepara??es para que os seres humanos retornem à Lua.
O professor Robert Wimmer-Schweingruber, do Instituto de Física Experimental e Aplicada da Universidade de Kiel na Alemanha, exaltou que preparar para a explora??o humana da Lua no futuro é uma ideia excelente.
"Se os astronautas voltarem para a Terra, a radia??o na Lua é o único perigo que permanece em seus corpos. Ent?o precisamos entendê-la", ressaltou.
Johan Koehler, chefe da Ciência do Sistema Solar e Consciência de Situa??o do Espa?o da Agência Espacial Nacional sueca, apontou que a explora??o do lado escuro da Lua é uma grande conquista da China. "Estamos muito felizes por sermos parte disso."
"Existe uma teoria de que a água na superfície da Lua é formada pela intera??o do vento solar com o regolito da superfície. Ent?o isso é algo que os cientistas suecos junto com os cientistas chineses querem responder", revelou Koehler.
A miss?o Chang'e-4, incluindo a sonda, o satélite de retransmiss?o Queqiao e um microssatélite orbitando a Lua, tem quatro cargas desenvolvidas através da coopera??o internacional, fornecendo mais oportunidades para os cientistas do mundo e combinando o expertise humano em explora??o espacial.
Para os astr?nomos, o lado escuro da Lua é um lugar de tranquilidade ideal, já que o corpo da Lua protege contra a interferência de rádio procedente da Terra. Desde lá, eles podem estudar as origens e a evolu??o das estrelas e galáxias, tentando entender a origem do universo.
A Chang'e-4 carrega instrumentos astron?micos de rádio de baixa frequência desenvolvidos por cientistas chineses e holandeses. "Conduzir tal observa??o no lado escuro da Lua é um objetivo precioso há longo tempo dos astr?nomos, e pode preencher lacunas na observa??o astron?mica", disse Zou.
A sonda também levou seis espécies vivas -- algod?o, colza, batata, arabidopsis, mosca-das-frutas e levedura -- para o ambiente sem vida para criar uma mini-biosfera, que deve produzir a primeira flor na Lua.
Os engenheiros espaciais chineses também planejam coletar dados ao medir constantemente as temperaturas na superfície da Lua.
"Explorar o lado escuro da Lua é uma contribui??o que a China está fazendo para o mundo. Embora ainda n?o conhe?amos o que poderíamos descobrir, esta explora??o pode influenciar diversas gera??es", destacou Shen Zhenrong, um projetista do explorador lunar.
Wu Weiren disse: "explorar o desconhecido é uma natureza humana. A Lua é um mundo misterioso para nós. Temos uma responsabilidade de explorá-la e entendê-la. A explora??o da Lua também aprofundará nosso entendimento sobre a Terra e nós mesmos."