Por *Pedro Sobral
O Yenching Global Symposium foi obrigado a reinventar-se este ano. Este evento anual, que tem lugar na prestigiosa Academia Yenching da Universidade de Pequim e reúne jovens académicos, empreendedores e profissionais de todo o mundo para discutir quest?es da atualidade e procurar consensos, viu a edi??o do ano passado ser cancelada devido ao impacto da pandemia. Este ano, gra?as aos esfor?os de uma competente equipa organizadora, o evento teve lugar online, via Zoom, entre os passados dias 16 e 18 de Abril. O simpósio, que tem por miss?o estimular o debate, construir la?os de camaradagem e criar solu??es para quest?es atuais, reuniu 155 representantes de 65 países, e contou com a presen?a de mais de 25 convidados e palestrantes, reputados especialistas nas suas diversas áreas de atividade.
Este ano, tive a oportunidade de me contar entre os representantes selecionados e, pese embora o fato de a pandemia me ter privado da oportunidade de visitar pessoalmente a Universidade de Pequim, de representar Portugal nas discuss?es. Ao longo dos três dias em que se desenrolou o evento, fui assistindo ao modo como os líderes de amanh? percecionam o estado atual do mundo e o papel da China nele.
O tema da edi??o de 2021 do Yenching Global Symposium, “Renova??o Compartilhada: Reconectando o Leste com o Oeste” (“Shared Renewal: Recoupling East with West”), reflete as preocupa??es da China com os desafios e tens?es que têm vindo a emergir em anos recentes e que foram discutidos durante a sess?o de abertura pelo vice-ministro do Ministério das Rela??es Exteriores He Yafei e pelo ex-ministro indonésio Marty Natalegawa. Para os dois intervenientes, estamos perante a necessidade de remodelar a arquitetura de governan?a global, de modo a fazer frente a problemas que já n?o respeitam limites locais, nacionais e mesmo continentais.
O programa do evento incluiu palestras sobre temáticas como Inteligência Artificial e 5G, a nova arquitetura de governan?a global, coopera??o entre países em desenvolvimento, educa??o e comércio num mundo pós-COVID-19, assim como a ascens?o da China enquanto potência responsável. Nas palavras de um colega representante, de nacionalidade australiana, contactar com a perspetiva chinesa relativamente a quest?es globais é cada vez mais importante: “Os chineses compreendem-nos e à nossa mundividência muito melhor do que nós compreendemos a deles. Em alturas como esta, com tudo aquilo que se passa pelo mundo, ouvir as perspetivas dos líderes chineses relativamente a quest?es críticas como as altera??es climáticas, a rela??o da humanidade com a tecnologia, e a governan?a global foi n?o só refrescante como valioso para a cria??o de compreens?o mútua, numa altura em que esta é mais necessária que nunca para fazer face a desafios comuns.”
No início e no final de cada comunica??o, foi pedido aos participantes que preenchessem pequenos inquéritos, por forma a auscultar a sua opini?o sobre as diversas temáticas abordadas. De modo geral, os jovens participantes consideram “urgente” uma reforma da OMC e afirmam ser “possível” a coopera??o entre ocidente e oriente, muito embora n?o se considerem diretamente impactados pela conflito comercial entre os Estados Unidos e a China. Relativamente à coopera??o da China com os países em desenvolvimento, os respondentes mostraram-se “relativamente otimistas” e confiam que a melhor forma de avan?ar tal coopera??o é “através dos respetivos governos e ministérios da economia” dos países envolvidos. Os representantes afirmaram unanimemente a sua cren?a no fortalecimento da coopera??o internacional em matéria climática e defendem a “cria??o de um mecanismo de coopera??o com a máxima brevidade possível”.
Durante o evento, houve também espa?o para uma visita, ainda que virtual, ao Jingyuan (Jardim da Serenidade) ber?o da Academia Yenching e lugar que apresenta uma mescla de influências na sua arquitetura e uma comunh?o de culturas na sua história. Antigas fotografias datadas dos anos 1940 mostravam-nos estudantes ocidentais e orientais comendo e conversando, numa atmosfera de harmonia e de partilha de perspetivas. N?o fosse a pandemia, qui?á fosse esse o ambiente que nos esperaria nos corredores e jardins do Jingyuan.
A ambi??o do evento em estimular a aprendizagem e a cria??o de solu??es para quest?es da atualidade teve o seu auge na organiza??o de uma simula??o da última cimeira dos G20, que teve lugar em novembro do ano transato na Arábia Saudita. Durante a simula??o, a partilha de vacinas com os países mais desfavorecidos e a cria??o de mecanismos mais igualitários no combate a esta e a futuras pandemias estiveram no topo das preocupa??es dos jovens representantes, que revelaram assim a sua solidariedade global e a sua oposi??o ao unilateralismo e ao protecionismo.
Com o mundo mergulhado ainda na crise provocada pelo novo coronavírus, novas quest?es vêm juntar-se às já existentes. Que li??es podemos retirar desta pandemia? O que podemos fazer para aumentar a resiliência global face a futuras catástrofes? Qual o caminho para a recupera??o? Como construir um futuro mais seguro e sustentável? Estas quest?es pairaram sobre as discuss?es do simpósio e pautam a atua??o dos profissionais e líderes do futuro. Enquanto estes persistirem na busca das respostas, reconectando ocidente e oriente, talvez um mundo pós-COVID mais solidário, pacífico e justo venha a ser mais do que uma esperan?a.
*O autor é mestre em Estudos Interculturais pela Universidade do Minho