O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, já está na China, onde buscará estreitar o relacionamento com seu principal parceiro comercial, n?o só no que tange à economia, mas também em temas como o multilateralismo, a manuten??o da paz mundial e promo??o do desenvolvimento global, temas em que os dois países mantêm posi??es convergentes. Na véspera da viagem, em entrevista exclusiva à Xinhua, Lula falou sobre suas expectativas nesta sua quarta visita (2004, 2008, 2009) ao país asiático como presidente brasileiro e o que mudou na rela??o entre os dois países e no mundo desde ent?o.
"Quando visitei Beijing pela primeira vez, em 2004 (durante seu primeiro mandato presidencial 2003-2006), poucos analistas vislumbravam que a parceria sino-brasileira assumiria a relevancia que possui hoje. Desde ent?o, nosso comércio cresceu 16 vezes e a China tornou-se o principal parceiro comercial do Brasil. Para além das rela??es econ?micas, nosso relacionamento adensou-se politicamente, à medida que estreitamos nossa coordena??o em instancias como o BRICS", recordou Lula.
O presidente brasileiro, que assumiu seu terceiro mandato em janeiro deste ano, enfatizou que "tenho certeza de que teremos um diálogo muito produtivo com a China, com quem compartilhamos muitos pontos de vista".
Para Lula, há muito a comemorar na rela??o com seu maior parceiro comercial desde 2009: "o valor das nossas exporta??es para a China é maior do que a soma das nossas exporta??es para os Estados Unidos e para a Uni?o Europeia. A China é um grande motor do agronegócio brasileiro".
E, segundo Lula, há espa?o para mais parcerias. "Gostaria que ela fosse também um grande motor da reindustrializa??o do Brasil, em bases sustentáveis. Há espa?o para iniciativas conjuntas em biocombustíveis e hidrogênio verde, por exemplo. Também queremos redobrar esfor?os em ciência, tecnologia e inova??o, desenvolvendo aplica??es práticas a partir das fronteiras do conhecimento científico".
"O governo brasileiro vem promovendo um programa de parcerias e investimentos que tem por objetivo melhorar a infraestrutura do país, com uma carteira abrangente de projetos em áreas como as de portos e aeroportos, rodovias, ferrovias e energia. Há vasto espa?o para a amplia??o de investimentos chineses nessas áreas, preferencialmente em parceria com as empresas brasileiras. Os investimentos chineses ainda s?o muito tímidos em rela??o ao patamar que poderiam atingir. Se no comércio já conquistamos marcas inéditas, nos investimentos ainda temos muito o que construir", ressaltou.
Questionado sobre a compara??o entre o plano de "reindustrializa??o" do Brasil lan?ado por ele e a "moderniza??o ao estilo chinês" promovida pela China e se as economias altamente complementares dos dois países podem ser aproveitadas para construir uma ponte para futuras coopera??es, Lula comentou que n?o há uma receita única para o desenvolvimento.
"Creio que o sucesso do 'caminho chinês para a moderniza??o' mostra que n?o há uma receita única para o desenvolvimento e que boas solu??es podem estar em toda parte, e cada país deve trilhar seu próprio caminho, conforme seus desafios históricos e suas potencialidades".
"O Brasil está engajado em criar o 'caminho brasileiro para a moderniza??o', que consiga conjugar crescimento econ?mico, redu??o da pobreza e das desigualdades sociais, sustentabilidade dos nossos recursos naturais extraordinários e elimina??o do racismo e da discrimina??o racial. Queremos crescer com justi?a social, sustentabilidade ambiental e respeito à democracia e aos direitos humanos", afirmou.
Sobre o papel desempenhado pela China no cenário internacional nos últimos dez anos, Lula comentou que o país asiático foi "o que mais tirou pessoas da pobreza na história. Foram centenas de milh?es de pessoas nos últimos 40 anos. é algo extraordinário e que serve de inspira??o para todos os países em desenvolvimento. A China é um exemplo impressionante de desenvolvimento que aconteceu beneficiando diversos parceiros comerciais no mundo, inclusive o Brasil, nesse processo".
Apesar de estarem geograficamente distantes, a China e a América Latina têm expandido e aprofundado intercambios e a coopera??o nas áreas de economia, comércio, cultura, educa??o e desenvolvimento social. Perguntado sobre como fortalecer ainda mais esta coopera??o, Lula enfatizou que a integra??o da América Latina e Caribe e, em especial da América do Sul "é uma grande prioridade" para o continente e disse que a China pode desempenhar um papel muito positivo para ajudar essa integra??o.
"N?o há integra??o regional possível se n?o há estradas, ferrovias, linhas de transmiss?o, telecomunica??es e conex?es aéreas e marítimas ligando nossos países. Uma integra??o efetiva precisa de uma base material. A China pode desempenhar um papel muito positivo na integra??o da infraestrutura da regi?o", ressaltou.
Com rela??o à estratégia que China e Brasil devem adotar para expandir e aprofundar a coopera??o para aumentar ainda mais a influência global do grupo BRICS (formado por Brasil, Rússia, índia, China e áfrica do Sul), Lula enfatizou que "a importancia global do BRICS n?o deve ser subestimada".
O presidente brasileiro destacou a importancia de manter a identidade e a coerência do grupo BRICS, o que significa apoiar o multilateralismo, promover um papel mais significativo dos países em desenvolvimento no sistema internacional e trabalhar por reformas nas institui??es globais, de modo a torná-las mais democráticas e representativas, inclusive no Conselho de Seguran?a da ONU.
Durante a entrevista, Lula foi perguntado sobre sugest?es de planos que Brasil e China podem realizar para fortalecer a coopera??o em mecanismos de governan?a global como o Programa das Na??es Unidas para o Desenvolvimento e a Organiza??o das Na??es Unidas para a Alimenta??o e a Agricultura, a Conferência da ONU sobre Mudan?as Climáticas e a Conferência de Biodiversidade da ONU, para promover desenvolvimento global, redu??o da pobreza e prote??o ambiental.
"Cada um deles tem suas particularidades e requer uma estratégia específica. Mas a Agenda 2030 continua a ser um bom guia para orientar nossas a??es nessas diferentes instancias. Ela é abrangente e aborda de forma articulada as três dimens?es - econ?mica, social e ambiental - da no??o de desenvolvimento sustentável, traduzindo um ideal de sustentabilidade com inclus?o e prosperidade para todos", disse.
"Poderíamos nos coordenar mais em organiza??es como a OIT, a UNESCO e a FAO para promover iniciativas de coopera??o trilateral. Uma pauta importante que tem sido negligenciada pela comunidade internacional, mas que o Brasil e a China valorizam, é o combate à fome. é um tema muito caro para mim. Gostaria muito de lan?ar uma grande iniciativa de combate à fome voltada para áfrica, com o apoio da China e da FAO", acrescentou o presidente brasileiro.
Treze anos após o término de seu segundo mandato e diante das mudan?as no cenário mundial relativas à estrutura política e econ?mica globais ocorridas desde ent?o, Lula, perguntado sobre quais assuntos internacionais China e Brasil devem fortalecer sua coopera??o e colabora??o, destacou a promo??o do desenvolvimento, o fortalecimento do multilateralismo e a defesa da paz.
"Essas quest?es continuam mais relevantes do que nunca. é importante que Brasil e China continuem somando suas vozes nesses assuntos. A esses, eu agregaria, hoje, o combate à mudan?a do clima. Trata-se de uma amea?a concreta, que afetará especialmente as popula??es mais vulneráveis e poderá fazer retroceder nossos esfor?os em prol da erradica??o da pobreza e da fome. Brasil e China podem liderar pelo exemplo, avan?ando na transi??o para uma economia de baixo carbono. O Brasil tem uma matriz energética limpa, que pode ser ampliada e integrada com investimentos chineses", acrescentou.