Como o mercado internacional foi lan?ado em uma turbulência pelas últimas manobras tarifárias de Washington, as empresas americanas ser?o beneficiadas? Dificilmente.
Imagine Emily, uma menina americana de seis anos de idade, cuja alegria do aniversário diminuiu quando o aumento das tarifas tirou sua boneca dos sonhos do or?amento de seus pais. Essa provavelmente seria uma realidade igualmente amarga para os fabricantes de brinquedos dos EUA.
"A tarifa vai nos afetar. Vai afetar nossos clientes, vai afetar o varejo. Portanto, é assustador", disse Suzy Brown, representante da MasterPieces, uma marca americana de quebra-cabe?as e jogos, à Xinhua em uma entrevista recente. "Agora estamos sendo atingidos por tarifas que n?o havíamos previsto."
Esse setor dos EUA está lutando contra o aumento dos custos e a ruptura. Isso n?o se deve apenas ao fato de que a maioria de seus produtos, ou matérias-primas e componentes, é adquirida no exterior, mas também porque as tarifas devem afetar a oferta, a demanda e a eficiência ao longo da cadeia industrial mais ampla.
N?o se trata apenas de brinquedos. Em vários setores, as empresas americanas est?o sentindo o aperto dos aumentos crescentes das tarifas de Washington. Longe de proteger as indústrias dos EUA, as medidas tarifárias acabar?o por sobrecarregá-las, inflando os custos, prejudicando os empregos e corroendo a competitividade geral.
"Embora as tarifas possam produzir algum efeito de curto prazo na prote??o de determinados setores dos EUA, no longo prazo, provavelmente tornar?o as empresas dos EUA menos competitivas, aumentar?o seus custos e prejudicar?o sua inova??o e eficiência", disse Zhou Chao, pesquisador da Anbound, um think tank independente da China.
Em sua última medida, a Casa Branca anunciou na quarta-feira um novo conjunto amplo das chamadas "tarifas recíprocas", impondo uma "tarifa básica mínima" de 10% e taxas mais altas para determinados parceiros comerciais.
Isso se seguiu a uma série de decis?es tarifárias flutuantes, como o anúncio de aumentos de impostos sobre as importa??es do Canadá, México e China, o adiamento de medidas sobre o Canadá e o México, a confirma??o de tarifas sobre o a?o e o alumínio e a introdu??o de novas tarifas sobre as importa??es chinesas, colocando tanto as empresas americanas quanto as empresas globais em uma montanha-russa de incertezas políticas.
O setor de varejo dos EUA ilustra muito bem esses desafios. Fortemente dependentes das cadeias de suprimentos globais para oferecer produtos a pre?os acessíveis, os varejistas est?o agora enfrentando press?es significativas.
"Uma tarifa é um imposto pago pelo importador dos EUA, n?o por um país estrangeiro ou pelo exportador", disse Jonathan Gold, vice-presidente de cadeia de suprimentos e política alfandegária da Federa??o Nacional de Varejo dos EUA, acrescentando que 'esse imposto acaba saindo do bolso dos consumidores por meio de pre?os mais altos'.
O que chega às prateleiras do varejo come?a muito antes na cadeia de suprimentos mais ampla, onde o setor de manufatura está particularmente alarmado com os aumentos das tarifas. As fábricas dos EUA dependem significativamente de matérias-primas e componentes importados, o que torna essas novas medidas tarifárias uma séria amea?a à sua competitividade e estabilidade.
"Os riscos para os fabricantes n?o poderiam ser maiores", disse Jay Timmons, presidente e CEO da Associa??o Nacional de Fabricantes, em uma declara??o online na quarta-feira, acrescentando que 'os altos custos das novas tarifas amea?am investimentos, empregos e cadeias de suprimentos'.
Sarah Shrader, proprietária e cofundadora da Bonsai Design, no Colorado, expressou preocupa??o com o impacto do aumento das tarifas em seus negócios, de acordo com a Camara de Comércio dos EUA. "Dependemos muito do a?o, bem como de materiais específicos do setor no mercado global", disse ela. "Estamos preocupados com o fato de que o aumento do pre?o de nossas matérias-primas e mercadorias será proibitivo para vendermos nossos produtos no mercado dos EUA."
Até mesmo o fornecimento alternativo oferece pouco alívio. A Grant Thornton, uma importante empresa de contabilidade, adverte que a mudan?a das cadeias de suprimentos para países mais favoráveis às tarifas pode acarretar custos de requalifica??o, restri??es de capacidade e preocupa??es com a qualidade.
Se o histórico servir de indica??o, embora os aumentos de tarifas possam oferecer aumentos de curto prazo para setores domésticos específicos, as altas geralmente resultam em perdas econ?micas mais amplas no futuro.
Veja, por exemplo, as tarifas da Se??o 232 dos EUA sobre a?o e alumínio, promulgadas em 2018. De acordo com a Funda??o Fiscal, um think tank internacional, essas medidas aumentaram os custos de produ??o para os fabricantes, reduziram o emprego nos setores afetados, aumentaram os pre?os ao consumidor e afetaram negativamente as exporta??es.
A funda??o estima que a revoga??o das tarifas e cotas da Se??o 232 aumentaria o PIB de longo prazo dos EUA em 0,02% e criaria mais de 4.000 empregos.
A economia por trás da cena é clara: os produtores nacionais de insumos tarifados, como os fabricantes de a?o e alumínio dos EUA, aumentaram seus próprios pre?os sob a cobertura das tarifas. Os fabricantes que consomem esses insumos enfrentam uma escolha difícil: absorver os custos ou repassá-los aos clientes, reduzindo potencialmente a demanda por produtos acabados, como equipamentos agrícolas, eletrodomésticos e maquinário de constru??o, disse a Grant Thornton em seu relatório.
Nos setores de tecnologia, a situa??o é ainda mais complexa. A Associa??o de Tecnologia do Consumidor informou, no início deste ano, que as tarifas sobre produtos eletr?nicos poderiam reduzir o poder de compra do consumidor americano em até US$ 143 bilh?es, com quedas significativas esperadas nas vendas de laptops, tablets, consoles de jogos e smartphones.
Sean P. Murphy, vice-presidente executivo de políticas do Conselho do Setor de Tecnologia da Informa??o, advertiu que essas barreiras comerciais aumentam os custos, enfraquecem o desenvolvimento de IA dos Estados Unidos e injetam incerteza política no caminho da inova??o do país.
O renomado economista americano Jeffrey Sachs, em uma entrevista recente à Xinhua, criticou a dire??o comercial de Washington. "Os Estados Unidos est?o cometendo um erro muito grave em sua política econ?mica ao se tornarem protecionistas", disse ele, acrescentando que, enquanto a China está se abrindo e promovendo modelos de tecnologia de código aberto, os Estados Unidos est?o optando por um modelo de tecnologia fechado.
Talvez o mais preocupante, entretanto, seja a incerteza que a turbulência tarifária injeta no planejamento de negócios em todos os setores nos Estados Unidos. Amea?as repetidas de tarifas e revers?es repentinas de políticas por parte do governo dos EUA provocaram cautela e hesita??o entre as empresas.
A Grant Thornton enfatiza que "a mudan?a para tarifas como política padr?o é uma situa??o desconhecida após décadas de ênfase no livre comércio e nas cadeias de suprimentos internacionais", levando as empresas a se envolverem em um planejamento significativamente mais detalhado e a desenvolverem medidas de contingência robustas.
Os fabricantes e importadores dos EUA já testemunharam o aumento dos custos dos insumos em antecipa??o às tarifas. Os pre?os do a?o, por exemplo, aumentaram entre 12% e 15% em fevereiro, de acordo com a Grant Thornton.
Enquanto as empresas americanas navegam por esses ventos comerciais voláteis, fazendo malabarismos com custos mais altos, revisando as redes de fornecedores e se esfor?ando para manter os pre?os controláveis, o ?nus econ?mico de longo prazo dessas políticas comerciais pode ser ainda maior e provavelmente se aprofundará ainda mais.
A Organiza??o para a Coopera??o e Desenvolvimento Econ?mico já revisou para baixo suas previs?es de crescimento dos EUA para 2025 e 2026, alertando que essas tarifas est?o come?ando a cobrar um impacto econ?mico mais amplo.
"Ainda estamos avaliando as implica??es macroecon?micas das medidas tarifárias anunciadas", disse a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, Kristalina Georgieva, em um comunicado na quinta-feira, "mas elas claramente representam um risco significativo para a perspectiva global em um momento de crescimento lento".