Um projeto pioneiro de mapeamento realizado por pesquisadores brasileiros revelou a extens?o das áreas livres de gelo na Antártica e, pela primeira vez, forneceu uma vis?o geral da distribui??o e da saúde da vegeta??o no continente mais austral, anunciou nesta segunda-feira projeto MapBiomas Antártica.
De acordo com o estudo, menos de um por cento do território antártico está livre de gelo: 2,4 milh?es de hectares, dos quais apenas 107 mil hectares possuem cobertura vegetal durante o ver?o austral. Esta é a primeira medi??o detalhada tanto das áreas livres de gelo quanto da cobertura vegetal no continente, considerado uma reserva natural internacional dedicada à pesquisa científica.
O trabalho foi realizado por uma iniciativa científica brasileira utilizando imagens de satélite combinadas com algoritmos de aprendizado de máquina e processamento em nuvem devido ao grande volume de dados. Segundo a pesquisadora Eliana Fonseca, coordenadora do mapeamento, compreender a dinamica natural do continente é fundamental para avaliar os efeitos locais das mudan?as climáticas e seus impactos globais. "O mapa de áreas livres de gelo é essencial para o monitoramento da fauna do continente, já que as espécies animais nidificam e eclodem nessas áreas durante o ver?o. O mapa da vegeta??o, por sua vez, fornece informa??es essenciais para avaliar a produtividade do ecossistema, permitindo-nos monitorar mudan?as ambientais e regi?es sensíveis", explicou.
Para estudar a flora, os pesquisadores utilizaram um indicador de sensoriamento remoto calculado a partir de imagens de satélite que permite analisar a saúde e a densidade da vegeta??o. "Durante o ver?o, espécies de musgos, algas terrestres e gramíneas crescem em áreas livres de gelo. Líquens crescem em rochas e podem ser observados n?o apenas em áreas costeiras, mas também no interior", explicou Fonseca.
O estudo também encontrou semelhan?as entre as forma??es vegetais da Antártica e do Brasil. Líquens, musgos e algas terrestres - classificados como crostas biológicas do solo - também aparecem em biomas brasileiros como o Pampa e a Caatinga, onde fornecem cobertura vegetal em áreas de vegeta??o esparsa. As gramíneas, por sua vez, est?o entre as plantas pioneiras e est?o presentes em todos os biomas do país.
A Antártida exerce influência direta sobre o clima de todo o Hemisfério Sul e é considerada a origem das frentes frias que afetam os padr?es de precipita??o. "O contraste entre as massas de ar frio e seco vindas da Antártida e a massa de ar quente e úmido que se forma sobre o Brasil influencia diretamente a precipita??o, tanto em volume quanto em frequência", afirmou a pesquisadora. Segundo ela, frentes frias muito intensas podem baixar as temperaturas até mesmo nos estados das regi?es Centro-Oeste e Norte.
A equipe observou que o estudo só foi possível após a coloca??o dos satélites Sentinel-2 em órbita polar, capazes de capturar imagens de alta resolu??o com ampla cobertura. Entre 2017 e 2025, as imagens só puderam registrar áreas livres de gelo entre dezembro e mar?o, período em que o Hemisfério Sul recebe a maior quantidade de luz solar. Durante esse período, ocorre também o fen?meno do "sol da meia-noite", quando o sol parece circundar o continente e projeta extensas sombras sobre as cadeias montanhosas do interior.
A coordenadora científica do MapBiomas, Júlia Shimbo, enfatizou que esta é apenas a primeira vers?o do mapeamento. "Esperamos que as futuras coletas envolvam mais cientistas e grupos de pesquisa da Antártica, trazendo n?o apenas melhorias no mapeamento de áreas livres de gelo e com vegeta??o, mas também adicionando outras variáveis", afirmou.